Há muito desconhecimento e até mitos em relação aos riscos de incêndio nas instalações elétricas prediais, em geral. Como professor aposentado de engenharia elétrica, tendo ensinado por muitos anos a cadeira de Instalações Elétricas (IE), pretendo fazer, abaixo, minhas considerações sobre tais desinformações, mostrando que o coração de uma IE é o seu sistema de proteção, isto é: os disjuntores que ficam nos quadros de distribuição e também na entrada da instalação, e cujos objetivos são a proteção da fiação contra sobrecargas e curtos-circuitos e contra choques elétricos e fugas de corrente. O texto visa a esclarecer o usuário leigo de uma IE.
SOBRECARGAS E CURTOS-CIRCUITOS
Incialmente, é importante definir
o que sejam sobrecarga e curtos-circuitos. Uma sobrecarga é uma situação
em que a corrente elétrica do circuito (entendido este como os fios que
alimentam as tomadas ou as lâmpadas ligadas e protegidas por um disjuntor termomagnético)
está num valor acima da corrente nominal (indicada no disjuntor correspondente),
até, no máximo, três (3) vezes acima dessa corrente. Já um curto-circuito
é uma corrente que está muito acima da corrente nominal do circuito, partindo
de cerca de três (3) vezes até cerca de 5, 10 vezes, ou mais, acima daquela
corrente. O disjuntor (elemento com tecla que se encontra no quadro de
distribuição dos circuitos) deverá desligar o circuito em questão de alguns
minutos para o caso de sobrecarga; e deverá fazê-lo em tempo praticamente
instantâneo no caso dos curtos-circuitos.
EXEMPLOS DE SOBRECARGA E DE
CURTO-CIRCUITO
Para que o leigo possa entender,
na prática, o que seja aquela corrente de sobrecarga, pode-se exemplificar:
vários equipamentos (televisão, computador, ventiladores, condicionadores de ar
portáteis, etc.) ligados, ao mesmo tempo, nas tomadas de um determinado circuito,
fazendo com que a corrente total do circuito atinja e supere um pouco o valor
da corrente anotada no disjuntor. Essa é uma situação pouco comum nas
instalações residenciais, mas que é possível de acontecer; e sendo o caso, como
dito acima, o disjuntor irá desligar o circuito em questão de minutos.
O caso de curto-circuito é ainda
mais raro, estando associado não tanto ao uso comum dos aparelhos elétricos,
mas a acidentes que acontecem com os eletricistas que estejam manuseando o circuito
“vivo”, isto é, energizado. Nesse caso, o contato acidental do fio fase (aquele
que dá choque) com o fio neutro (azul, que não dá choque, em geral) ou com o
fio terra (normalmente, de cor verde) provoca a circulação de uma corrente
muito elevada (curto-circuito) que deve ser imediatamente eliminada pela
proteção (disjuntor). O valor da corrente vai depender da tensão (127V ou 220V)
e da resistência total dos fios e da resistência do sistema de aterramento. Normalmente,
nas instalações elétricas residenciais, essa corrente estará na casa dos 100 a 300A
(ampères), mas que circulará pela fiação em tempo praticamente nulo, pois a
proteção é dimensionada para eliminar tal corrente quase que instantaneamente,
visto que os efeitos da circulação desse nível de corrente na fiação, seriam
destruidores. Na prática, ouve-se um forte estalo de origem elétrica, acompanhado
de faíscas e aquecimento no ponto de contato do curto-circuito. Outra situação
provocadora de curto-circuito estaria associada ao uso de um aparelho elétrico já
bastante usado, por exemplo, uma torradeira, em que, por falta de manutenção,
haja o contato interno dos fios fase e neutro ou do fio fase com a carcaça
aterrada do equipamento. É uma situação também não muito comum.
O QUE É UM DISJUNTOR
Um disjuntor é um interruptor
automático sensível a correntes de sobrecarga e de curto-circuito. No caso
de sobrecargas, o elemento térmico constituinte do disjuntor sentirá aquela
corrente acima da nominal (como explicado acima) e desligará o circuito em
tempos inversamente proporcionais ao valor da corrente: tanto mais acima da
corrente nominal (lida na tecla do disjuntor, normalmente) tanto menor o tempo
(em minutos) para a atuação da proteção (desligamento). No caso de curtos-circuitos,
o elemento magnético constituinte do disjuntor sentirá a forte corrente de curto-circuito
e desligará o circuito instantaneamente, na casa dos milissegundos (milésimos
de segundo): tempo que também segue a proporcionalidade inversa ao valor da
corrente.
O disjuntor poderá ser monopolar
(ligado à fase do circuito), protegendo um circuito de 127V (fios fase, neutro
e terra), ou poderá ser bipolar (Iigado a duas fases), protegendo um circuito
de 220V (duas fases e o fio terra). O tripolar (monitorando três fases) será,
normalmente, usado para motores elétricos trifásicos ou colocado na entrada da
instalação que requeira as três fases (instalações que possuem grande quantidade
de circuitos e alta carga elétrica instalada). Cada disjuntor estará
monitorando (protegendo) um único circuito elétrico, existindo, no entanto, um
disjuntor geral na entrada da IE.
DESCRIÇÃO DE UM CIRCUITO ELÉTRICO
PREDIAL
Um circuito elétrico deverá ser constituído
por um elemento de proteção da fiação (o disjuntor), por um elemento de
proteção – muito importante! – contra choques elétricos e contra correntes
de fuga (o DR: disjuntor Diferencial-Residual), pela fiação
necessária, e pelas tomadas (pontos de conexão com os aparelhos elétricos do
usuário da instalação). Pode-se, ainda, incluir uma proteção contra surtos de
tensão (picos de voltagem provocados por raios nas redondezas da IE), que é
conhecido como DPS (Dispositivo de Proteção contra Surtos):
protegerá os equipamentos ligados às tomadas da IE, limitando o valor de pico
da tensão que possa estar entrando na IE a partir da rede elétrica da concessionária
de energia.
Pode-se afirmar que o sistema de
PROTEÇÃO é o coração da IE. Se ele estiver bem dimensionado e com manutenção ao
longo do tempo, a IE estará, de fato, protegida contra incêndios, choques elétricos,
correntes de fuga anormais, sobretensões (surtos) e curtos-circuitos
acidentais.
A IMPORTÂNCIA DA FIAÇÃO ELÉTRICA
A fiação elétrica deverá ter uma
camada isolante (a isolação de cores variadas) de boa qualidade e “não-propagadora
da chama”. Isso quer dizer: se a isolação for submetida ao fogo, tal chama não
se propagará e será extinta assim que a fonte de calor cessar. No entanto, a
isolação sofrerá os efeitos da chama, queimando-se e derretendo, conforme o
tempo de exposição à fonte de calor. A bitola (dimensão transversal do fio –
também chamado “condutor”) deverá ser proporcional à corrente nominal prevista
pelo projetista para aquele circuito.
O CIRCUITO ELÉTRICO DE TOMADAS
Para não aprofundar demais os
detalhes de uma IE, tomemos, como exemplo, a existência de um circuito de tomadas,
muito comum nas IE de um apartamento ou de uma casa. Várias tomadas estarão associadas
a um determinado circuito de tomadas (também chamado de circuito de “força”),
espalhadas pelas paredes de um ou dois quartos (um circuito), ou pelas paredes
da sala (outro circuito), ou ainda pelas paredes da cozinha e da área de
serviço (um ou dois circuitos). A fiação padrão para esses circuitos de tomadas
é, no mínimo, o fio (ou condutor ou cabinho) com seção transversal de número 2,5mm2
(dois e meio milímetros quadrados), cuja capacidade de condução de corrente, ao
ar livre, é de 24A, aproximadamente. Estando contido, esse fio, dentro de um
eletroduto (ou conduíte), embutido na parede, e acompanhado de outros fios (2, 4,
6 ou mais), o valor efetivo da corrente que poderá percorrer tal condutor deverá
ser menor do que esse valor acima: é o que é chamado “modo de instalação” do
condutor. Normalmente, pode-se associar uma corrente de 20A (portanto, disjuntor
de proteção de 20A) a esses condutores de bitola 2,5mm2 que constituem
os circuitos de tomada de uma IE, o que daria uma carga instalada de cerca de
2.500W (watts), para um circuito de 127V, e de cerca de 4.400W, para um
circuito bipolar de 220V. Portanto, um circuito de tomadas de 127V (o mais
comum nas residências) poderá ter 12 tomadas de, por exemplo, 200W cada uma, de
acordo com o critério do projetista. Isso não significa que só se possa ligar
um equipamento ou aparelho elétrico de no máximo 200W em uma dessas tomadas!
Isso é apenas para efeito de projeto. O importante é que o total de potência
ligado nessas tomadas (desse circuito) não passe de 2.500W, o que daria a tal
corrente nominal (máxima) do circuito. Ligando-se mais potência do que os
2.500W previstos para o circuito, o disjuntor sentirá como uma sobrecarga,
e o circuito será desligado em questão de minutos.
FIM DA 1ª PARTE
Uilso Aragono (julho de 2023)
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