sexta-feira, 31 de março de 2017

COMO ESTUDAR E COMO APRENDER (PARTE I)

Como professor universitário há mais de 35 anos, cheguei à seguinte conclusão, dentre outras: o professor não tem o poder de ensinar; é o aluno que aprende! Ou seja: ninguém ensina nada; tudo se aprende! Este é o tema do presente texto. A seguir vamos tentar justificar esta afirmação por meio de alguns argumentos e exemplos.

O ENSINO É VIRTUAL E A APRENDIZAGEM É REAL

O ensino é um termo que passa a ideia de que alguém (normalmente um professor) possa levar o outro a aprender, a dominar e a se apossar de um determinado conhecimento. No entanto, ninguém tem esse poder! Não há como se colocar na cabeça de alguém um conhecimento, teórico ou prático, que essa pessoa ainda não possua. Portanto, contrariamente ao que se acredita – mais uma das ilusões de nossa sociedade! – o ensino tradicional, em que se supõe que alguém com um conhecimento prévio (o professor) possa transmiti-lo a quem não o possua ainda, está baseado em uma falácia (uma aparente e falsa verdade)!

O ensino, portanto, pode ser entendido como, de fato, algo virtual, etéreo, intangível... O que ocorre, na verdade, é que existe um processo de aprendizagem real. Esta, sim, a aprendizagem, é real, é concreta, é tangível. Portanto, o maior responsável pela aprendizagem do aluno é ele próprio! Os pedagogos já suspeitavam dessa verdade ao utilizar a expressão, muito comum, "processo de ensino-aprendizagem". O que, na verdade, reconhece o fato de que o ensino é algo que não existe por si mesmo, mas teria sua existência atrelada à aprendizagem.

Interessante notar que existe o termo "aprendiz", mas não existe o termo "ensinador". Por que será?...

PERIGO DE ACREDITAR-SE NO ENSINO

A mentalidade existente em nossa sociedade mundial, de que exista o ensino, torna-se um problema a mais para quem quer aprender. Porque leva o estudante a acreditar que o professor tenha o poder de lhe ensinar. Acredita o aluno que, sentado diante de um professor, e exposto às suas aulas – e muitas vezes, bem preparadas! – esteja aprendendo. E a legislação das escolas, normalmente, vem confirmar esta crença, na medida em que estabelece um percentual de presença às aulas não menor que 75%. Isto, de fato, confirma nas cabeças a crença de que a presença às aulas seja fator fundamental para a aprendizagem. Quando, na verdade, não é!

Seja uma pequena demonstração de que a aula não ensina nada. Ou, pelo menos, ensina muito pouco. (Pode-se aceitar que durante a aula algum conceito básico, simples, possa ser facilmente compreendido pelo aluno. No entanto, a aprendizagem não é somente a compreensão de algum conceito ou algo novo, como será visto à frente.) A demonstração baseia-se no fato de que nenhum aluno, após ter assistido a todas as aulas durante um mês, ao final desse período submeta-se à avaliação (à temida "prova") sem mais estudos; confiando, simplesmente, naquilo que, supostamente, tenha aprendido durante as aulas! Ao contrário: o aluno, nos dois ou três dias antes da prova, concentra-se no estudo pessoal buscando, ele próprio, às suas custas, com base em suas anotações, alcançar a aprendizagem do conteúdo apresentado.

O aluno está, portanto, sujeito a uma "pegadinha". Porque é levado – mesmo que inconscientemente – a acreditar que as aulas "ensinem", tendo, por consequência, uma atitude de passividade durante essas mesmas aulas. O professor, igualmente, acredita nessa falácia: que possa estar ensinando algo. A consequência é que os alunos vão acumulando presenças nas diversas disciplinas, e perdendo tempo de estudo. Coisa que só acontecerá alguns poucos dias antes das provas, uma vez que o aluno, nesse tempo, percebe que não reúne os conhecimentos necessários para enfrentar uma prova. Pergunta-se: para que assistir a tantas aulas se o aluno não conseguiu a suposta e desejada aprendizagem? Para que tantas aulas, se, na verdade, o aluno é que dedicará todos os esforços para adquirir – por si só, na maioria das vezes – o conhecimento desejado?

Ora, se, então, o professor não tem poder para ensinar, para que serve o professor? – Serve para muitas coisas, menos para "ensinar"!

PARA QUE SERVE O PROFESSOR

O professor, uma vez aceita a afirmação de que não tem poder para ensinar, o que faz? Faz muita coisa. Torna-se um facilitador, um "ajudador", um incentivador, um avaliador, etc. O professor tem grande importância, sobretudo, quando esclarece as dúvidas do aprendiz; quando orienta seus esforços por meio de um plano de estudos (que na prática é o "plano do curso"); quando dá testemunhos práticos de sua própria evolução no seu processo de aprendizagem...

Nos aspectos do incentivo dos alunos e da sua motivação – grande e importante missão do professor! – pode-se dizer que cabe, de fato, ao professor ser este grande incentivador e motivador dos alunos. Cabe ao professor reconhecer que o grande objetivo de um curso, não é, simplesmente, levar o aluno a adquirir alguns conhecimentos propostos, mas, sobretudo, levar o aluno a "amar" a disciplina, ao final do curso! Pois somente amando o assunto é que o aluno, mesmo tendo já concluído, com aproveitamento, o curso, estará aberto a continuar sua busca de aprendizagem durante toda sua vida de estudante e profissional.

Por isto pode-se dizer que quando um professor não atrapalha o aluno, em seu processo de aprendizagem, ele já o está ajudando muito! E, ao contrário, se o professor atrapalhar o estudante, sendo arrogante, antipático, terrorista, ameaçador, etc., o que conseguirá será, justamente, inibir e traumatizar o aluno em relação ao conteúdo da disciplina. Incluem-se aqui, infelizmente, todas as pessoas traumatizadas em muitas disciplinas estudadas na sua formação escolar, tais como: português, matemática, inglês, para citar apenas algumas.

Vê-se assim, o quão importante torna-se o professor no processo de aprendizagem dos alunos. Ele, embora não tenha a capacidade de ensinar, joga um papel fundamental nesse processo, tanto para o bem, quanto para o mal.

O QUE É UM ESTUDO EFICAZ

Para que o aluno tenha um estudo eficaz, ele deve meditar sobre o que seja o processo de estudar. Em primeiro lugar, constata-se que o estudo é um processo individual. O estudo coletivo somente se dá numa etapa posterior, em que os estudantes que se unem, já tenham feito o seu estudo inicial, que é, normalmente, de forma pessoal, individual.

Num segundo momento pode-se constatar, facilmente, que o estudo é um processo doloroso. Isto é, o aluno passa, necessariamente, por momentos de angústia, de dúvidas, e com sentimentos de incapacidade. No entanto, o estudante deve conscientizar-se de que este é uma etapa fundamental, em que o cérebro está sendo questionado, desafiado a compreender os conceitos, as definições ligadas ao assunto estudado. E cada aluno fará isto no seu ritmo, com base em sua capacidade e suas limitações. Aqui reside mais uma dificuldade associada ao suposto "ensino". O professor, quando em sala de aula, impõe o seu único ritmo à turma inteira, sem respeitar as características individuais de aprendizagem de cada aluno. Não sendo isto culpa do professor. É inerente ao processo de transmitir conteúdo durante uma aula tradicional (quadro de anotações e turma de alunos diante do professor).

Num terceiro momento, o estudo torna-se, finalmente, um processo prazeroso. Isto por que o aluno, agora, sente-se mais capacitado, com mais poder! – Ele tem o poder de explicar para alguém, o que acabou de dominar. Pode resolver um problema matemático ou de engenharia; pode explicar, de forma clara, um conceito ou uma definição qualquer.

TRÊS FASES DO ESTUDO: L,R,F

Tendo caracterizado o que é o estudo, pode-se caracterizar, agora, o que seja um estudo eficaz. Este pode ser entendido como constituinte de três fases, resumidas nas letras L, R, e F: L de Ler, R de Reler, e F de fixar.

A primeira letra "L" vem de LER, porque num estudo pessoal sempre haverá algum material para ser lido. E a primeira leitura de um capitulo, por exemplo, dará ao aluno uma visão geral do conteúdo, embora não haja qualquer garantia de entendimento nesse primeiro contato com a matéria, supostamente nova. Aplica-se, também, a qualquer aula, presencial ou a distância, ou palestra ou conferência, em que o assunto novo seja apresentado ou ouvido pela primeira vez. Não há, aqui, condições de aprendizagem. Trata-se, tão somente, de uma visão geral sobre o assunto, e num ritmo imposto pelo professor. Assim como o aluno não para uma aula, também a primeira leitura de um capítulo deve ser feita de forma linear, sem pausas, mesmo que não se tenha entendido algum parágrafo: o importante, nesse momento, é adquirir-se uma visão geral do capítulo.   Este LER coincide com o primeiro momento do estudo, acima discutido: é um processo individual: cada aluno acompanha de forma pessoal, com sua capacidade particular de concentração e com seus próprios pré-requisitos.

A segunda letra "R" vem de RELER, porque, depois do primeiro contato, com a visão geral obtida pela leitura do capítulo, por exemplo, o aluno desejará reler o capítulo. Mas de uma forma mais pausada, dando tempo para reflexão e elaboração de dúvidas. É a fase mais duradoura e mais penosa, já que aqui o aluno fará todos os esforços para alcançar o esclarecimento das dúvidas surgidas. Estas poderão ser resolvidas por meio de outros livros, por meio do professor ou de algum colega que possa ajudar. Nesta fase alcança-se a compreensão, o entendimento do assunto, dos conceitos, das definições. Este RELER coincide com segundo momento do estudo, acima discutido: é um processo, de fato, doloroso, dispendioso de tempo, cansativo... Mas é indispensável ao processo de busca da verdadeira aprendizagem.



A terceira letra "F" vem de FIXAR, porque é nesta fase que o aluno, tendo já compreendido o conteúdo sendo estudado, procurará, necessariamente, fixar, isto é, memorizar tudo o que foi entendido. Como toda aprendizagem supõe a memorização, um estudo eficaz exigirá, necessariamente, o esforço de fixação na memória. Isto se dará por meio de exercícios, explicação a colegas e elaboração de resumos. Dada a importância desses resumos, serão tratados a seguir. Este FIXAR coincide com o terceiro momento do estudo, acima discutido: é um processo prazeroso! De fato, ao fixar o conteúdo aprendido, sente-se grande satisfação. Finalmente, o assunto está dominado. O estudo foi eficaz!

(Continuação no próximo  blogue)

//Desejando ler a parte II, basta clicar no link abaixo:
https://mondaespero-blog-uilso.blogspot.com/2017/05/como-estudar-e-como-aprender-parte-ii.html

//Desejando ler sobre o mesmo assunto, basta clicar no link abaixo:
https://mondaespero-blog-uilso.blogspot.com/2013/10/o-professor-e-aprendizagem.html

Uilso Aragono. (Março de 2017)

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Sou formado em Engenharia Elétrica, com mestrado e doutorado na Univ. Federal de Santa Catarina e Prof. Titular, aposentado, na Univ. Fed. do Espírito Santo (UFES). Tenho formação, também, em Filosofia, Teologia, Educação, Língua Internacional (Esperanto), Oratória e comunicação. Meu currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4787185A8

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