Toda língua nacional é muito difícil
de ser totalmente dominada. Os erros se multiplicam, tanto na forma falada
quanto na forma escrita. E são erros que não são percebidos como tais, mas, ao
contrário, impõem-se como se fossem as expressões mais acertadas do idioma.
Muitos deles têm ocorrido com tanta frequência que a forma correta, ao ser
utilizada, parecerá, aos que a ouvirem ou a lerem, a forma errada! ...
Neste texto proponho explorar
alguns desses erros comuns e generalizadamente utilizados, seja na forma
falada, seja na forma escrita do idioma.
1. “SEJA ISTO, SEJA AQUILO”
Algumas expressões tais como “seja
isto, seja aquilo”, “ou isto, ou aquilo”, têm sido deturpadas e utilizadas em
forma mista. Exemplos:
“Seja
você um empreendedor, um microempresário, ou um simples empregado, a batalha é difícil”.
Parece não haver erro. Mas há! O correto seria: “Seja você um empreendedor, um
microempresário, seja um simples empregado...”. A expressão correta é: “seja
isto, seja aquilo”.
2. SUBSTANTIVO NO SINGULAR, E NÃO
NO PLURAL
Errar na concordância nominal
deveria ser algo difícil de acontecer, já que é muito simples esta regra: um
pão é gostoso; dois pães são gostosos... O termo “gostoso” varia em número
(plural ou singular), conforme o sujeito! Veja-se o exemplo abaixo.
“O
Autor revela que o fracasso da economia russa e chinesa nos anos anteriores...”.
Parece, de novo, um texto sem erros de português. No entanto, uma leitura mais
atenta identificará que se trata de duas economias: a russa e a chinesa; e não
de uma economia “russa-chinesa”! Portanto, o correto seria: “O Autor revela que
o fracasso das economias russa e chinesa nos anos anteriores...”.
3. TRATA-SE E TRATAM-SE
“Trata-se de” significa: “fala-se
de”, ou “comenta-se sobre”. Já “tratam-se de” significa: “cuidam-se de”. Vejam-se
os exemplos abaixo.
“Tratam-se
de duas pessoas diferentes”. Se for o caso de um enfermeiro tratando de duas
pessoas, o texto estará correto! Mas se o contexto mostrar que se fala de, que
se comenta sobre duas pessoas diferentes, então o texto estará errado! O
correto, neste caso, seria: “Trata-se de duas pessoas diferentes”.
4. ERRO DE SUBJUNTIVO (MUITÍSSIMO
COMUM)
O subjuntivo é um caso particular
de uso tão comumente errado – tanto na expressão escrita quanto na falada –,
que merece (como já o fiz) um artigo à parte. Veja-se um exemplo abaixo.
“É
difícil encontrar um pesquisador cuja contribuição foi tão variada”. Embora aparentemente
correta, um olhar mais atento revelará o erro de subjuntivo. Trata-se de
distinguir os modos verbais INDICATIVO e SUBJUNTIVO. Este último passa ideia de
incerteza e subjetividade. Aquele (o Indicativo) passa ideia de certeza e
objetividade. Portanto, o correto seria: “É difícil encontrar um pesquisador
cuja contribuição tenha sido tão variada”. Observe-se que, de fato, a
frase passa ideia de incerteza: é difícil (embora, não impossível) encontrar...
O modo INDICATIVO estaria correto se fosse: “A contribuição do pesquisador foi
muito variada”. Neste caso: certeza e objetividade!
Outro exemplo:
“Tudo
leva a crer que esses quatro apóstolos já conheciam Jesus”. Aparentemente
correta, a frase contém erro de subjuntivo. A incerteza é claríssima na frase:
tudo leva a crer, embora não se tenha certeza... Portanto, a expressão correta
seria: “Tudo leva a crer que esses quatro apóstolos já conhecessem Jesus”.
A conjugação utilizada na frase “conheciam” só poderia ter sido utilizada se o
modo fosse o indicativo (ou afirmativo): “Os quatro apóstolos já conheciam
Jesus”.
Em resumo: os termos crer, ou
acreditar, ou esperar, ou talvez exigem o uso do modo subjuntivo já que são termos que passam a mensagem de
incerteza e subjetividade.
A Utilização errada das
preposições “de” (sentido indefinido) ou “das” ou “dos” (sentido definido e com
marca de gênero) tem sido muito comum em textos, inclusive, revisados. Esses
revisores que não identificam tais erros deveriam fazer uma boa revisão de seu
próprio conhecimento...
Alguns exemplos:
“Essa
atitude, embora não resolva o problema do pai ou mãe emocionalmente doente...”.
Verifica-se, aqui, que tal frase, embora, aparentemente correta, contém o tal
erro acima descrito. O Correto seria escrever-se: “Essa atitude, embora não
resolva o problema do pai ou da mãe emocionalmente doente...”. A
explicação é simples: ou se utilize o “de”, com sentido genérico ou se especifica
cada personagem (pai e mãe). Uma possibilidade alternativa poderia ser: “Essa
atitude, embora não resolva o problema de pai ou mãe emocionalmente
doente...”. Mas, ao escolher-se escrever “do pai”, fica a obrigação de se
escrever “da mãe”, pois: de + o = do; e de + a = da. Escrita de outra forma,
para o melhor entendimento da correção feita, tem-se: “Essa atitude, embora não
resolva o problema de o pai ou (de) a mãe emocionalmente
doente...”.
6. PRECISO OU NECESSÁRIO?
O uso dos verbos preciso e
necessário é vítima de total confusão. Navegar não é preciso! É necessário!
Portanto, a famosa expressão “Navegar é preciso, viver não é preciso” não
utiliza um bom português. O verbo “precisar” irá supor, normalmente, um sujeito
vivo que precisa fazer algo ou precisa de algo. O verbo “necessitar” já não
carece de um tal sujeito. Portanto, “Navegar é necessário, viver não é
necessário”. Mas: “Eu preciso navegar, eu preciso viver”.
Outros exemplos:
Os
alunos precisam de mais apoio nos seus estudos. O diretor precisa se relacionar
melhor com os funcionários.
Novos
equipamentos são necessários ao laboratório. O laboratório necessita de novos
equipamentos. Decisões mais ousadas são necessárias.
7. MEU CORAÇÃO E NOSSO CORAÇÃO
O uso, tanto em frases faladas
quanto naquelas escritas, do plural de nosso coração é totalmente estranho,
embora comumente usual. Padres e pastores costumam dizer “Nossos corações devem
encher-se de paz! ”. Ora, no singular seria: “Meu coração deve encher-se de paz”
; no plural deveria ser: “Nosso coração deve encher-se de paz”. Por que
utilizar-se o plural do que já é plural?
A regra é simples e lógica.
Ouvidos, olhos, mãos, pés, rins, pernas, etc., o singular e o plural serão:
Meus
ouvidos; nossos ouvidos. Meus olhos; nossos olhos. Meus rins; nossos rins.
No caso de órgãos únicos: nariz,
boca, coração, mente, inteligência, alma, etc., o singular e o plural serão:
Meu nariz;
nosso nariz. Minha boca; nossa boca. Meu coração; nosso coração. Minha mente;
nossa mente. Minha alma; nossa alma. Torna-se, portanto, tão estranho dizer “Nossos
corações” quanto dizer “Nossos narizes”! ...
Igualmente, em relação a pertences.
O correto é dizer, no singular e no plural: minha casa, nossa casa. Ao dizer-se “nossas
casas”, a ideia passada é de que cada um de nós tem mais de uma casa, o que não
é, normalmente, o caso.
8. USO DE ARTIGOS DEFINIDOS E
INDEFINIDOS
Os artigos indefinidos (um, uma,
uns, umas) e os definidos (o, a, os, as) devem ser usados com cuidado. Os
indefinidos passam, justamente, a ideia de indefinição, de generalidade. Já os
definidos, de fato definem as coisas. Assim, deve-se dizer:
“Os
conflitos, angústias e ansiedades são comuns ao homem de hoje”. A frase,
aparentemente correta, está errada pela simples inclusão do artigo definido “os”.
Há duas possibilidades corretas:
“Conflitos,
angústias e ansiedades são comuns ao homem de hoje”; ou “Os conflitos, as
angústias, e as ansiedades são comuns ao homem de hoje”. Observe-se que
a utilização do artigo inicial “Os”, definindo a palavra “conflitos”, exige a
definição dos demais termos (angústias e ansiedades).
Este artigo deverá ter
continuidade, pois os erros comuns do nosso português são quase infinitos...
Que língua mais difícil! ...
Uilso Aragono. Março de 2016
2 comentários:
Como fazer a concordância: uma das pessoas mais ousada ou ousadas?
Se ainda servir o esclarecimento... O correto é dizer: "Uma das pessoas mais ousadas..." (no plural). Isto é: "Das pessoas mais ousadas (que conheço) uma é essa". Ainda: "Ele é um dos melhores alunos que já tive". Saudações. Uilso.
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