domingo, 3 de novembro de 2013

DIA DE TODOS E SANTOS E DIA DE FINADOS

Este artigo visa a esclarecer aos católicos, e a quem se interessar, os significados associados ao dia de Finados (feriado nacional, 2 de novembro) e ao dia de Todos os Santos (1º de novembro, celebrado no domingo seguinte). São reflexões de um leigo que está sempre buscando esclarecer-se sobre a doutrina de sua Igreja e buscando partilhar esse conhecimento, tão útil à vida social e à vida espiritual de todos nós.

INTRODUÇÃO

Para bom entendimento dos significados propostos é necessário, inicialmente, que recordemos o que a Igreja Cristã Católica entende pelo termo “Igreja”. Este termo deve ser entendido como a “assembleia dos santos”, ou o conjunto de todos os que buscam santificar-se em Cristo. A Igreja Católica, portanto, vê-se, a si própria, como uma igreja de três dimensões: a Igreja militante, a Igreja padecente, e a Igreja triunfante. A Igreja militante é o conjunto dos cristãos que ainda vivem na Terra e lutam ( ou militam) por sua santificação; a Igreja padecente é o conjunto de todos os já falecidos mas que não conseguiram santificar-se plenamente, morrendo com algumas “manchas” de pecado na alma, necessitando, portanto, purificar-se no Purgatório; a Igreja triunfante é o conjunto de todos os santos que morreram em estado de graça e conseguiram partir sem quaisquer “manchas” de pecado na alma, tendo direito a irem “direto” para o Céu, para participar da visão beatífica de Deus. Vemos, então, que a Igreja de Cristo é uma entidade não apenas terrena, mas, em conformidade com a doutrina que coloca Cristo como sua “cabeça”, também, uma entidade espiritual ou celestial, na medida em que tem seus membros congregados nessas três dimensões citadas. Fala-se, por consequência, que a Igreja é, também, a “comunhão dos santos”, santos entendidos como todos aqueles que buscam a santificação e que um dia, pela graça de Deus, certamente a alcançarão, ou ao fim desta vida terrena (todos os santos), ou ao fim do tempo espiritual correspondente ao Purgatório.
A partir do bom entendimento do conceito de Igreja, como visto acima, os significados dos dias citados já podem ser esclarecidos. Pode-se, então, estabelecer a diferença fundamental entre o dia de Finados e o dia de Todos os Santos.

DIA DE TODOS OS SANTOS

O dia de Todos os Santos é o dia estabelecido pela Igreja Católica para que todos nós, cristãos, recordemos a vida e as realizações de todos aqueles nossos entes queridos, amigos, e conhecidos, que, embora, como todos nós, tenham pecado, conseguiram, no entanto, morrer em estado de graça e tendo alcançado sua plena purificação ainda aqui, nesta Terra, com a graça de Deus e por meio de dores e sofrimentos vividos em união com Cristo e a Igreja. Mas não se trata aqui dos santos de altar, isto é, dos santos oficiais da Igreja, pois esses já têm seu dia marcado no calendário de festas e celebrações litúrgicas da Igreja. Trata-se, portanto, de todos os demais cristãos que, embora tenham alcançado uma vida santa já aqui na Terra, não são oficialmente reconhecidos como “santos”, mas que, de fato, aos olhos de Deus viveram vidas santas. São todas aquelas pessoas em relação às quais temos a impressão de que, de fato, por tudo o que viveram e sofreram, foram exemplo de cristãos, isto é, foram verdadeiros santos entre nós.

DIA DE FINADOS

Dia de Finados, ou dia dos mortos, ou dia dos defuntos, é o dia estabelecido pela Igreja Católica para que todos os cristãos se lembrem de seus falecidos que possam estar no Purgatório. É o dia das almas dos que estão no Purgatório. É o dia em que, em especial, nos recordamos de nossos entes queridos que faleceram, sem que tenhamos a certeza de que tenham alcançado a bem-aventurança (a santidade). É uma dia de lembrança, de homenagem, de emoções, de oração, e de oferecimento de missas e de sacrifícios pelas almas desses nossos entes queridos, para que sejam ajudados a superar “o tempo espiritual” (chamado “evo”, na teologia) correspondente ao seu sofrimento purificador e santificador, necessário a compensar as penas temporais não cumpridas no tempo de sua vida terrena. Essas “penas temporais” são aquelas devidas a pecados cometidos, perdoados, mas que não foram “compensados” por penas durante a vida terrena; penas essas associadas, normalmente, a jejuns, abstinências, esmolas, visitas a doentes, obras de caridade, participação em missas, e a dores e sofrimentos normais da vida, oferecidos a Deus por si e por outros. O tempo espiritual no Purgatório é um tempo de sofrimento purificador e santificador em que, diante da próxima visão beatífica de Deus, separada, talvez, como que por um fino véu, a alma procura santificar-se para ser digna de, finalmente, ultrapassar essa barreira final para alcançar o Céu. A alma reconhece que ainda não é digna, ainda não atingiu a necessária santidade de vida para encontrar-se face a face com seu Deus. Por isso sofre, angustia-se, arrepende-se de não ter buscado a santidade com mais empenho, enquanto ainda peregrinava na Terra. Nesse sofrimento, a alma pode ser ajudada pelos irmãos na Terra – dentro do conceito de Igreja como comunhão dos santos – por seus sacrifícios, sofrimentos e orações oferecidos a Deus por amor a essas almas e unidos no Amor de Cristo.

SOBRE O INFERNO

Nunca teremos certeza sobre o destino de alguma pessoa, a não ser em relação ao Céu. Se essa alma foi para o Purgatório ou para o Inferno, nunca teremos certeza nesta vida. Se algum ente querido foi para o Céu, esta certeza pode ser alcançada por meio de tudo o que conhecemos da vida da pessoa e por uma visão espiritual que a Graça de Deus possa nos comunicar. Não sabendo, portanto, se um ente querido, ou mesmo uma pessoa conhecida, após a morte tenha ido para o Purgatório ou para o Inferno, podemos e devemos rezar por sua alma. Deus, que tudo conhece, saberá dirigir nossas preces e nossos méritos para as almas que estiverem no Purgatório. Se a alma foi para o Inferno, que é um estado de separação definitiva de Deus, para nada lhe poderão servir as orações do cristão na Terra. Infelizmente e lamentavelmente essa realidade existe: no Inferno o sofrimento ocorre por absoluta consciência de que o amor a Deus foi negado, apesar de todas as graças disponíveis, e não há mais possibilidade de recuperação. O sofrimento da alma no Inferno é um sofrimento sem esperança, enquanto o sofrimento no Purgatório é, ao contrário, pleno da esperança celestial.

SOBRE AS INDULGÊNCIAS

Ligado à questão das penas temporais, a Igreja nos propõe a realidade das chamadas indulgências. Estas são dispensas ou cancelamentos de penas temporais relativas a pecados cometidos e já perdoados, mas cujas penas temporais ainda não foram cumpridas. Este conceito teologal está ligado à realidade dos méritos de Cristo, isto é, a tudo o que Jesus conquistou por meio de sua vida santa e sua morte redentora na cruz. É um tesouro riquíssimo, infinito, que a Igreja, como Cristo que ainda caminha na Terra, pode aplicar a uma alma, assim como o próprio Cristo aplicou muitas vezes e em sua vida terrena. Um cristão, portanto, pode beneficiar-se desse enorme Tesouro, ao cumprir certas exigências de oração e obras de caridade impostas pela Igreja, e receber indulgências parciais ou plenárias: no primeiro caso, muitas das penas temporais devidas são canceladas; no segundo caso, todas as penas temporais devidas são anuladas, até aquele momento. Isto significa que uma pessoa, tendo recebido indulgências plenárias, ao morrer logo em seguida, em estado de graça, irá diretamente para o Céu, tornando-se mais um dos santos de nossa Igreja. As indulgências são um benefício que Cristo concede à nossa fraqueza moral e espiritual. Por nós próprios, teríamos muita dificuldade de pagar nossas penas temporais devidas pelos nossos pecados, e correríamos o risco de irmos para o Purgatório; com as indulgências, os méritos de Cristo são aplicados à nossa fraqueza e apagam, efetivamente, nossas penas, ajudando-nos no nosso processo de santificação.

O CONCEITO BÍBLICO DE PURGATÓRIO

O dia de Finados tem sua base bíblica no segundo livro dos Macabeus (2 Mc 12,46). Este livro é um dos sete livros do Antigo Testamento que nossos irmãos evangélicos retiraram da Bíblia católica para transformá-la na Bíblia evangélica. Infelizmente, por questões não muito bem explicadas, e que não dá para aprofundar neste artigo, esse livro não está presente na Bíblia dos evangélicos, os quais, portanto, baseando sua crença, unicamente na Bíblia, não têm como acreditar no Purgatório. Mas este livro, que por mais de mil anos já pertencia à Bíblia – que é, eminentemente e originalmente, católica! – expõe, claramente, a crença dos antigos judeus na existência do Purgatório: “Por isso, (Judas Macabeu) mandou oferecer um sacrifício pelo pecado dos que tinham morrido, para que fossem libertados do pecado” (2 MC 12,46).

CONCLUSÃO

O dia de Finados e o dia de Todos os Santos são dois momentos importantíssimos na vida do cristão, pois bem compreendidos e bem celebrados têm todas as condições de levar-nos a uma vida cristã mais santa e santificadora. Celebrando-os com consciência estaremos vivenciando de forma admirável e eficaz a realidade da comunhão dos santos, que nos beneficia a todos que buscamos um mundo mais justo, mais santo e mais feliz.


Uilso Aragono (No dia de Finados, 02/novembro de 2013)

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Sou formado em Engenharia Elétrica, com mestrado e doutorado na Univ. Federal de Santa Catarina e Prof. Titular, aposentado, na Univ. Fed. do Espírito Santo (UFES). Tenho formação, também, em Filosofia, Teologia, Educação, Língua Internacional (Esperanto), Oratória e comunicação. Meu currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4787185A8

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