Este blogue faz uma reflexão complementar ao texto já apresentado anteriormente (ver....Jesus não teve irmãos) sobre a questão de Jesus ter tido ou não irmãos de sangue. Ou seja: Terão, Maria e José, tido outros filhos, além do Filho de Deus, Jesus, anunciado pelo anjo Gabriel aos dois? Além dos argumentos já apresentados, outros serão considerados abaixo, particularmente explorando o significado do termo “até que” no Evangelho .... e a interpretação mística que a Igreja Católica dá para interpretar Maria como “sempre Virgem”, antes, durante e depois do parto.
(O primeiro artigo: "Jesus não teve irmãos" é acessado pelo link: Jesus não teve irmãos)
A expressão “até que”
No Evangelho de Mateus encontra-se: “E tendo acordado, José fez como lhe
propusera o anjo do Senhor e aceitou sua mulher. E não a conheceu até que
deu à luz um filho, e nele pôs o nome de Jesus” (Mt 1, 25). Essa expressão “até
que” não é uma expressão que indique mudança de situação. Neste caso, sendo
interpretada como se José, depois de Maria ter dado à luz, a tivesse conhecido,
isto é: teria tido relações sexuais com ela e teriam tido outros filhos. Tanto
hoje quanto no tempo de Jesus, essa expressão “até que” é usada no sentido de
que uma situação perdurou até aquele momento, mas nada afirma sobre mudança
posterior.
Um padre, no seu jubileu sacerdotal de 46 anos usou, recentemente, a
expressão: “Sou agradecido a Deus que até hoje me ajudou a ser fiel ao
meu sacerdócio”. Será que o padre quis dizer que depois desse “hoje” Deus
deixaria de ajudá-lo a continuar a ser seu fiel sacerdote? É claro que não... É
apenas uma forma de expressão, uma forma de linguagem.
E no tempo de Jesus, também era assim. E a Bíblia está cheia de
expressões idênticas ou semelhantes, como pode ser pesquisada nos textos: Dt
34,6; Sl 110,1; St 72,7; Mt 24,29; 2Sm 6,23; Mt 11,3; Mt 8,22; 1Tm 4,13, além
de muitos outros exemplos, que mostram uma situação que continua, mesmo depois
do momento indicado pela expressão “até que”, ou similar. Nessa última citação
(1Tm 4,13), o Apóstolo pede a Timóteo para se devotar a leituras, exortações e
ensinamentos “até que” ele chegue. Será
que deve ser interpretado que Timóteo deva mudar de conduta depois que Paulo chegar?
É claro que não! Ele continuará a se devotar àquelas coisas, mesmo depois da
chegada do Apóstolo!
Portanto, seja no tempo de hoje, como no tempo de Jesus, a expressão “até
que” não deve ser interpretada como uma mudança de situação a partir do momento
indicado! José, como tudo leva a crer, nesses dois mil anos de vivência e de
ensinamentos da fé cristã católica, e de vivências místicas de muitos santos, continuou
a “não conhecer” (ou não ter relações sexuais) com Maria, mesmo depois do
nascimento de Jesus. O versículo objetivava apenas ressaltar que durante todo o
tempo de espera do parto, José não conheceu Maria. E tudo indica que tal
situação permaneceu depois do parto, embora o versículo não tenha tido essa
intenção, que, no entanto, por meio da boa e adequada interpretação, nos leva a
assim entender.
Razões místicas
O misticismo cristão (refere-se à busca e à experiência direta da união
com Deus) e a mística cristã (o estudo e a prática das tradições místicas
dentro da fé cristã) particularmente na Igreja Católica, é uma experiência
religiosa muito importante, pois, por bondade divina, complementa e esclarece
nossa fé por meio dos muitos testemunhos dos inúmeros místicos da vida cristã
ao longo dos séculos. Esses testemunhos foram, e ainda são, dados através de
visões, revelações ou êxtases espirituais que ultrapassam o entendimento
racional.
A Bíblia está cheia dessas experiências místicas, incluindo as de Maria
e José, que foram visitados por anjos (que falam em nome de Deus ou o
representam, sendo seus mensageiros). As experiências místicas na Bíblia e na vida
cristã são muito fortes, marcando fortemente a vida do místico, a ponto de provocar
nele uma verdadeira conversão de vida. A conversão de São Paulo, que, como se
diz, “caiu do cavalo” ao ver e ouvir o Senhor Jesus, mudou-lhe a vida completamente,
passando e perseguidor da Igreja de Cristo a evangelizador cristão. Muitas outras
experiências místicas na Bíblia poderiam ser citadas, e todas com a mesma forte
conversão do místico:
- Jonas, que teve de pregar a conversão da cidade de Nínive, após ser “obrigado”
por ordem divina;
- Isaías, que se tornou profeta depois de ter tido uma visão
impressionante de Deus no templo, onde viu serafins e ouviu a voz de Deus (Is
6, 1-8);
- Abraão, que teve a coragem de oferecer o próprio filho único, em holocausto,
após ter recebido uma ordem direta de Deus (Gn 22, 1-13);
- Jeremias, que foi chamado por Deus ainda jovem e teve várias visões e
experiências que moldaram seu ministério profético (Jr 1,4-10);
- Jacó, que depois de ter lutado contra o anjo de Deus, assumiu um novo
nome – Israel – por ordem do próprio anjo (Gn 32, 25-30);
- Moisés, que, segundo uma intrigante tradição rabínica, após seu
primeiro contato direto com Deus deixou de se relacionar sexualmente com sua
esposa (MEIER, J. P. A Marginal Jew, Doubleday, 1991).
Todas essas experiências místicas levaram esses profetas a uma profunda
mudança de vida e a um compromisso com a missão que Deus lhes confiava.
Maria e José e suas experiências místicas
Também Maria e José tiveram fortes experiências místicas por meio do
anjo Gabriel. Maria foi a escolhida por Deus para ser a Mãe do Salvador, Jesus,
e de uma forma totalmente sobrenatural. Ela teve uma experiência fortíssima da
ação e da presença de Deus sobre ela. Pois não tendo qualquer contato sexual
com “homem algum” viu crescer em seu ventre o Filho de Deus. Essa experiência,
certamente, marcou tanto Maria, Nossa Senhora, que ela não teve outro caminho a
seguir senão continuar virgem e com seu ventre consagrado ao Senhor, mesmo
sendo esposa de um varão. José, por sua vez, depois de sua experiência mística,
por meio das palavras do anjo, em sonho, não teve dúvidas em aceitar Maria como
sua esposa e de respeitar, igualmente, aquele ventre sagrado que fora visitado
pelo Espírito Santo de Deus para a encarnação do Deus Filho! Pode-se perguntar:
que homem “justo”, que hoje chamaríamos de “santo”, não se decidiria por não “conhecer”
sua esposa ao reconhecer nela a esposa do Espírito Santo, a Mãe do Deus
Salvador (Jesus = Deus salva)?
Conclusão
Conclui-se, portanto, que a posição da Igreja Católica diante da expressão
“irmãos de Jesus”, iluminada por tantos argumentos linguísticos, sociológicos e
místicos, é de acolher a verdade de que Maria e José, tiveram um único Filho,
Jesus, e que os demais “irmãos” e “irmãs” citados nos Evangelhos são, na
verdade parentes (como primos). E que Maria e José, verdadeiros esposos,
optaram, diante de tão forte e transformadora experiência mística e real por
manterem-se castos e poder cuidar com toda a dedicação daquele que lhes foi
confiado de forma tão amorosa pelo próprio Deus!
Uilso Aragono (dezembro de 2024).
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