quinta-feira, 30 de abril de 2015

ACIDENTE OU CRIME NA ESTRADA?

Um motorista que, dirigindo numa rodovia, desrespeite a velocidade máxima ou desrespeite a sinalização de ultrapassagem proibida e acabe causando a morte de outro motorista, ou de uma família inteira, em decorrência dessa irresponsabilidade, terá “sofrido um acidente” ou “cometido um crime”?

Nossas autoridades e nossos legisladores precisam ter em conta esta questão. Há necessidade urgente de que tal reflexão seja aprofundada sob todos os pontos de vista para que se chegue a uma resposta condizente com o razoável, com a ética e com o espírito de justiça.

No meu ponto de vista, após a reflexão que já me propus e fazer (e que já rendeu m texto neste meu blogue), não há dúvidas: a situação que abre este texto caracteriza não um simples acidente, mas um verdadeiro crime de trânsito. Ou, talvez, um “acidente criminoso”! Senão, vejamos os argumentos a seguir.

ALGUNS ARGUMENTOS

Segundo o dicionário Houaiss, a definição de acidente pode ser: 1. acontecimento casual fortuito, inesperado; ocorrência 2. qualquer acontecimento desagradável ou infeliz, que envolva dano, perda, sofrimento ou morte. Não há dúvidas de que a batida frontal de dois carros ou de um caminhão e um carro resulte em acidente, conforme essas definições. Portanto, um acidente, de fato, caracteriza o episódio acima. No entanto, a definição de número um (1) supõe “acontecimento fortuito”, o que não é o caso de um acidente fruto de imprudência e irresponsabilidade: neste caso, o motorista tinha consciência de que estivesse em alta velocidade ou ultrapassando em local impróprio e que um acidente poderia acontecer. No fundo, ele fica preocupado com a “roleta russa” que está jogando. Sabe que ao ultrapassar em local proibido – portanto, com pouca visibilidade da vinda de outro carro na direção contrária – está jogando com a sorte; está arriscando a própria vida e a de outros! Insisto: é um acidente. Mas um acidente criminoso! Porque o motorista sabia que, ao arriscar-se perigosamente, colocava em risco outros motoristas, outros cidadãos inocentes, que poderiam, caso ocorresse o acidente, morrer sem qualquer possibilidade de defesa...

Um segundo argumento baseia-se no fato de que, antes da ocorrência do “acontecimento desagradável, infeliz, com perdas, sofrimento ou morte” (acidente, sentido 2 do Houaiss), o motorista que desrespeitava a velocidade máxima, ou abusava da sorte por ultrapassagem em local perigoso e, portanto, proibido, já estava na ilegalidade; já estava cometendo um crime por desrespeito às leis de trânsito. E estas, todos sabemos, existem para garantir a segurança de todos os motoristas, de todos os condutores de veículos automotores. Crime, conforme o Houaiss é: 1. transgressão imputável da lei penal por dolo ou culpa, ação ou omissão; delito.


CONSCIENTIZAÇÃO NECESSÁRIA

Nossos legisladores, nossos juízes, nossas autoridades, precisam conscientizar-se de que o acidente fatal que tenha sido provocado por um ato anterior ilegal, já criminoso, tem de ser tratado como “acidente criminoso” (somente sentido 2, acima), e não um simples acidente. Este, somente deveria ser aceito como “acidente simples” se, de fato, estivesse associado a uma fatalidade. Explicando melhor: se o motorista estivesse dirigindo dentro das leis de trânsito e ocorresse um acidente (nos dois sentidos acima citados), mesmo com morte resultante, este acidente seria considerado acidente propriamente dito, fruto de uma fatalidade, e não um “acidente criminoso”, como deveria ser classificado o exemplo anterior.

CRIME CULPOSO OU CRIME DOLOSO

Resumindo os argumentos acima, e associando os conceitos “acidente criminoso” e “acidente simples”, ocorridos no trânsito, aos conceitos “crime culposo” e “crime doloso”, deveriam ser feitas as seguintes relações:
                Crime culposo = não se aplica a nenhum “acidente simples” de trânsito.
                Crime doloso = acidente criminoso de trânsito.

A explicação é simples. No “acidente simples” de trânsito, ocorrem os dois sentidos da definição de acidente, conforme o Houaiss: ocorre, de fato, um acontecimento inesperado. Mas não há crime! Não há desrespeito à Lei. Um exemplo simples pode ser dado. Se um motorista, na cidade, dirigindo com atenção e dentro da Lei, na velocidade máxima (40 km/hora, por exemplo),  é surpreendido por uma criança que surge correndo na rua de tal forma que, mesmo tendo freado com freio ABS, a criança seja atingida e venha a morrer, não se lhe pode imputar qualquer crime! Terá sido uma verdadeira fatalidade. E a culpa, se houve, terá sido dos responsáveis pela criança, que a teriam deixado solta na calçada, com a possibilidade de que invadisse a rua.

Já no “acidente criminoso” de trânsito, ocorre, sem sombras de dúvidas, o dolo! Conforme o Houaiss, uma definição de dolo, em termos jurídicos é: em direito penal, a deliberação de violar a lei, por ação ou omissão, com pleno conhecimento da criminalidade do que se está fazendo. O motorista que, antes de um acidente de trânsito, esteja em situação de crime, isto é, “deliberadamente violando a lei”, e venha a provocar a morte de outro cidadão, terá cometido “dolo”. Afinal, ele terá tido “pleno conhecimento da criminalidade do que estava fazendo, e, também, das possíveis – e, até, prováveis! – consequências de sua imprudência, de seu crime! Como não considerá-lo doloso? Vamos acordar, autoridades do Brasil!...

CONCLUSÃO
               
Enquanto nossas autoridades, nossos legisladores, não acordarem para a necessária distinção entre “acidente criminoso de trânsito” e “acidente simples de trânsito”, em que, o dolo esteja associado, clara e indelevelmente, ao acidente criminoso, não teremos uma solução razoável para as tristes estatísticas de acidentes fatais no trânsito, nas rodovias e nas estradas do Brasil. Os motoristas precisam receber, com clareza, a mensagem de que fatalidades no trânsito estarão associadas, tão somente, a acidentes simples. E aos acidentes criminosos o dolo estará automaticamente associado. Isto levará o motorista potencialmente imprudente e criminoso, a ter consciência de que será responsabilizado perante a lei por um crime verdadeira e claramente doloso, e não, simplesmente “culposo”, como tem sido, infelizmente, a prática de nossas autoridades, jurídicas e policiais, diante de tais acidentes criminosos!

Uilso Aragono. Abril de 2015.

Quem sou eu

Minha foto
Sou formado em Engenharia Elétrica, com mestrado e doutorado na Univ. Federal de Santa Catarina e Prof. Titular, aposentado, na Univ. Fed. do Espírito Santo (UFES). Tenho formação, também, em Filosofia, Teologia, Educação, Língua Internacional (Esperanto), Oratória e comunicação. Meu currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4787185A8

Seguidores