sexta-feira, 30 de março de 2012

QUARESMA – UM TEMPO LITÚRGICO MÓVEL E SEU SIGNIFICADO


A Quaresma é um período de quarenta dias em que os católicos são incentivados e orientados pela Igreja a fazerem, com mais dedicação, três exercícios espirituais – esmola, jejum e oração – em preparação à grande festa da Páscoa cristã.

ORIGEM DA QUARESMA

Esse tempo propício à conversão e à penitência é baseado no número quarenta por estar este número associado a alguns eventos muito significativos na história sagrada. O povo hebreu, guiado por Moisés, passou quarenta anos em peregrinação no deserto, em direção e de volta à terra prometida. Moisés ficou quarenta dias e quarenta noites no monte Sinai, quando então, recebeu as tábuas da Lei diretamente das mãos de Deus. Jesus passou quarenta dias e quarenta noites no deserto, como experiência espiritual na sua preparação para o início da sua vida pública, tendo sido tentado pelo diabo no momento em que sentia fome e sede. Outros eventos ligados ao número quarenta ainda existem e podem ser conferidos na Bíblia. Particularmente esse período de quarenta dias de Jesus no deserto, com significado de retiro espiritual, com muito jejum e oração, pode ser considerado como a origem litúrgica da Quaresma.

ORIGEM DA PÁSCOA

Os hebreus, depois que retornaram à terra prometida, a Palestina, começaram a celebrar a grande festa da Páscoa, que significa “passagem”: da vida de opressão e morte no Egito à vida de liberdade na sua própria terra. Eles escolheram o início do ano no seu calendário lunar, que coincide, também, com o início da primavera no hemisfério norte, o que correspondia ao dia 14 do mês de Nissan. Esse dia corresponde, também, ao chamado equinócio da primavera, quando o dia, que durava menos do que a noite durante o inverno, agora igualava a noite e, a partir de então, cresceria até tornar-se bem maior que a noite, durante o verão. Ora, este simbolismo remetia à consciência de que as trevas foram superadas pela luz, que a vida em liberdade vencera a morte na escravidão do Egito. Nesse dia, ainda, ocorria, sempre, a Lua cheia, já que o calendário hebraico era e continua a ser um calendário lunar, isto é, cada mês é de 28 dias, correspondente aos 28 dias de rotação da Lua em torno da Terra. O dia 14 de Nissan era, portanto, pleno de significado religioso para o povo hebreu, que a partir desse dia comemorava aquela importante festa da Páscoa, num período de Lua cheia e luminosidade noturna bem maior que noutros dias, e com dias cada vez mais longos que as noites.

Os católicos, tendo em vista todo o simbolismo e toda a tradição do povo hebreu na celebração de sua Páscoa, aproveitaram esse mesmo simbolismo para aplicá-lo à Páscoa cristã. Afinal, à semelhança da Páscoa judaica, a ressurreição de Jesus marca para nós a Páscoa cristã, isto é, a passagem de Jesus da escravidão da morte para a liberdade da vida gloriosa, tendo a morte sido definitivamente derrotada pela Sua ressurreição.

DATA MÓVEL PARA A PÁSCOA

O aproveitamento da data dos hebreus (14 de Nissan) não era viável, visto que o calendário ocidental é solar e não seria possível, portanto, ter-se um dia fixo para a Páscoa cristã. No entanto, o período simbólico do equinócio da primavera, quando o dia iguala-se à noite e começa a tornar-se gradativamente maior que esta, foi aproveitado e a Lua cheia passou a ser uma referência importante para a determinação do dia do domingo da Páscoa. Este ficou determinado como sendo o primeiro domingo logo depois da primeira Lua cheia do início da primavera no hemisfério norte (ou do outono no hemisfério sul), ou o próprio domingo, se a primeira Lua cheia caísse num domingo.

Já tendo o domingo como o Dia do Senhor, isto é, todo domingo é, teologicamente falando, o domingo da ressurreição, a Igreja houve por bem determinar a Quaresma – período que precede o domingo da Páscoa – como sendo constituída pelos quarenta dias anteriores, mas sem contar os domingos. Estes, por si só, são sempre domingos de alegria e festa: domingos de ressurreição. Ora, seis semanas antes do domingo da Páscoa, sem contar os domingos, dão trinta e seis dias, contando ainda, para trás, o sábado, a sexta e a quinta, chega-se à quarta-feira de cinzas, completando-se quarenta dias. O Carnaval, outra festa móvel, resulta no dia anterior, a terça-feira.

Se este cálculo procede, então a Quaresma é o período de quarenta dias (sem contar os domingos) que vai da quarta-feira de cinzas até o sábado de aleluia, o dia anterior ao domingo da Páscoa. Portanto, argumentos que dizem que a Quaresma termina ou no domingo de ramos ou na quinta-feira santa, não fazem sentido.

PARA BEM VIVER A QUARESMA

Quando a Igreja propõe aos seus fiéis um período mais propício a um retiro espiritual, marcado por jejum, oração e esmola, não está tanto querendo colocar ênfase no sofrimento como meio de purificação e perdão de pecados. Está, sim, mais preocupada com o fato de que os cristãos precisam, dada a própria condição humana – marcada pelo sofrimento nas várias dimensões da vida – exercitar a solidariedade com aqueles irmãos mais sofridos em nossa sociedade. Pelo jejum, o cristão se volta para si mesmo, buscando o seu autodomínio; pela oração, ele se volta humildemente para seu Deus; pela esmola, o cristão se volta para o seu semelhante, para o seu próximo, num exercício mais prático de solidariedade e partilha. A Igreja acredita que tais exercícios têm muito a contribuir para o crescimento espiritual dos fiéis. E este crescimento terá como consequências a santificação da própria Igreja e, por seu intermédio, a santificação do mundo.

Os fieis, para bem viverem esse riquíssimo retiro quaresmal, devem conscientizar-se de que os exercícios propostos valem a pena e não devem ser vividos somente durante a Quaresma, mas, especialmente, nesse período. Os exercícios quaresmais devem fortalecer os cristãos para os desafios da própria vida cristã ao longo de todo o ano, não se limitando apenas ao período da Quaresma. Esse período litúrgico, finalmente, visa a colocar o cristão, uma vez por ano, em sintonia fina com o seu Mestre, Senhor e Salvador, Jesus Cristo, especialmente naquilo em que consistiu sua Missão: a redenção dos pecados pela sua paixão, sua morte e sua gloriosa ressurreição.

Uilso Aragono, março/2012

Quem sou eu

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Sou formado em Engenharia Elétrica, com mestrado e doutorado na Univ. Federal de Santa Catarina e Prof. Titular, aposentado, na Univ. Fed. do Espírito Santo (UFES). Tenho formação, também, em Filosofia, Teologia, Educação, Língua Internacional (Esperanto), Oratória e comunicação. Meu currículo Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4787185A8

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